Se fosse vivo, o escritor Soeiro Pereira Gomes teria comemorado 100 anos de dia no dia 14 de Abril. Nascido no Porto, mas vivendo em Alhandra boa parte da sua vida, Soeiro Pereira foi um dos grandes obreiros da estrutura clandestina do PCP no Ribatejo. E boa parte dessa estratégia de resistência foi concebida em Vaqueiros e em Pernes, freguesias por onde Soeiro Pereira Gomes andou escondido, em especial numa zona, os Rodeados em Vaqueiros, de onde o escritor chegou mesmo a editar um jornal chamado “Ribatejo”, numa tipografia clandestina instalada numa azenha, próximo do rio.
Foi para recordar estas e outras passagens do escritor por estas bandas, e para assinalar o centenário do seu nascimento, que o PCP organizou em Vaqueiros e em Pernes uma tarde de evocação de Soeiro Pereira Gomes. Lá estiveram Domingos Abrantes, do Comité Central, José Marcelino, candidato da CDU à Câmara de Santarém, Madeira Lopes, entre outros dirigentes e militantes e população. Óscar Vieira - filho do histórico lutador anti-fascista de Pernes, Manuel Vieira – recordou que aprendeu a rever-se desde muito novo na obra mais conhecida de Soeiro Pereira Gomes, os “Esteiros”, um livro que fala sobre a exploração do trabalho infantil nos telhais de Alhandra (o livro é dedicado “aos filhos dos homens que não foram meninos”) mas em que Óscar Vieira encontrou muitas semelhanças com aquilo que via à sua volta em Pernes.
Também a sua mãe, Souzel Vieira, recordou histórias de convivência com Soeiro Pereira Gomes, as reuniões clandestinas no moinho dos Rodeados, propriedade da sua família, em que também esteve muitas vezes Álvaro Cunhal reunido com o seu camarada escritor. “Soeiro Pereira Gomes aparecia-nos umas vezes vestido de fiscal das farinhas, outras vinha como criado dos senhores ricos, outras vezes era primo do meu pai…tudo para escapar à PIDE”, conta Souzel Vieira, que chegou a ser “pombo-correio” da luta clandestina para ir recolher e recrutar camaradas de partido nas redondezas. “Era o Soeiro Pereira Gomes que me dizia como é que eu me havia de vestir naquele dia específico para servir de sinal ao camarada que estivesse à minha espera. E tínhamos também uma senha”, conta. O Moinho dos Rodeados pertenceu a Policarpo Marcelino Gonçalves, conhecido em Pernes e arredores como o Papum, e Irene Cadima, pais de Souzel Vieira. Na altura dos 50º aniversário da morte de Soeiro Pereira Gomes, que se assinalaram há 10 anos, Policarpo Gonçalves recordava que um dos exemplares do jornal “Ribatejo” – que teve ao todo três números – precisa de ser agrafado e tinham acabados os agrafos. O pernense foi ter com um conhecido que tinha uma loja e pediu-lhe todos os alfinetes que haviam. Levantou-se a duvida do porquê de tantos alfinetes. O lojista só veio a saber quando recebeu o jornal e encontrou os alfinetes que tinha vendido. O jornal “Ribatejo” era escrito na sua maioria por Soeiro Pereira Gomes e também o foi por Álvaro Cunhal, e contava as lutas e os problemas da região em apenas três folhas agrafados e impressas a partir de uma tipografia instalada numa azenha.
Histórias de um imprensa clandestina que contrasta com a imensidão de blogues livres, plurais, personalizados, de massas ou de nichos que proliferam na Internet, para já não falar de páginas e sites, rádios, revistas, Tv’s, etereceta e tal…